"Não devemos desistir perante a injustiça"

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Quando começou a trabalhar para a Biedronka?

Fui contratada em 1997 como operadora de caixa e alguns meses depois ofereceram-me o cargo de gerente de loja. Sabia que teria de me esforçar mais mas não fazia ideia de que teria de trabalhar para além das minhas forças. Nunca esperei que tivesse que ser, ao mesmo tempo, assistente de loja, operadora de caixa, responsável de armazém e empregada de limpeza.

Porque tinha de fazer isso tudo?

O contrato estipulava que eu tinha de assumir todos os deveres de gerência e que, se alguém faltasse, teria de o substituir sem qualquer compensação monetária. Ao fim de alguns meses percebi que era impossível fazer tudo em oito horas de trabalho diárias. Todos os meses trabalhava 300 horas em vez de 170. A loja estava aberta sete dias por semana e quase esqueci o que eram folgas. Era um verdadeiro pesadelo.

Nunca se queixou?

Muitas vezes. Era amiga da gerente regional há muitos anos, pensei que compreenderia. Tentei convencê-la a contratar mais pessoas. Sempre me disse que se eu não estava à altura que me fosse embora, que tinha mais dez ou vinte novos dispostos a trabalhar. Lutei durante 18 meses sem sucesso. Um dia achei que não aguentava mais e decidi escrever uma carta a reclamar. Despediram a minha amiga e nada mais.

Quem decidia as regras da loja?

Eu recebia indicações da gerente regional e ela recebia-as da Jerónimo Martins Distribuição. Eles diziam o que tínhamos de fazer e conseguir mas esqueciam-se do trabalhador e das suas capacidades. Só eu e os outros trabalhadores sabemos o tempo e o esforço que era necessário para cumprir tudo o que nos era exigido. Acredito que esta situação absurda foi criada pelas elevadas taxas de desemprego que temos na Polónia.

O que aconteceu depois?

Estava com graves problemas de saúde, durante mais de seis meses tive de tomar antidepressivos. Tinha de me forçar diariamente a ir trabalhar. Os gerentes começaram a ameaçar-me e a rebaixar-me. Durante as reuniões avisavam-me que se eu persistisse arranjariam forma de me prejudicar, acusando-me de furto. Isso seria o meu fim. Nunca mais ninguém me daria emprego. Senti que estava no limite das minhas forças e decidi que a minha família estava primeiro. Foi quando me despedi.

E os outros trabalhadores? Ninguém a ajudou?

Estava por minha conta. As pessoas tinham medo de falar do que se passava.

Como conseguiu apoio?

Um dia telefonei para uma estação de televisão e decidi contar a minha história. Foi assim que pude contar aos polacos o que se passava nos "campos de trabalho" a que chamam supermercados Biedronka. Foi quando a Fundação de Helsínquia para os Direitos Humanos me ofereceu ajuda, permitindo-me recorrer ao seu advogado. Houve ex-trabalhadores da Biedronka que começaram a telefonar-me e a apoiar-me. Só mesmo os que continuam a trabalhar na empresa é que têm medo de fazer alguma coisa e eu compreendo -os. Mas tenho uma filha de 13 anos e sempre lhe tentei ensinar que há regras e que não devemos desistir perante situações de injustiça, mesmo que tenhamos o frigorífico vazio e contas para pagar.

Já lhe chamaram o novo Lech Wale-sa... Tem planos para uma carreira política?

Não se deve dizer nunca, mas para já não. Sou apenas uma mulher comum que quer ajudar pessoas que tenham passado pelo mesmo que eu. As pessoas acreditam em mim, vêem-me como um exemplo, não as posso desiludir.

Qual o seu objectivo?

Que a Biedronka mude a sua forma de tratar os empregados.

Bozena Lopacka

Ex-funcionária da biedronka

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